Acórdão do Tribunal de Justiça (Grande Secção) de 20 de dezembro de 2017
Asociación Profesional Elite Taxi contra Uber Systems Spain, SL
Processo C-434/15
PARECER DO ADVOGADO-GERAL SZPUNAR
entregue em 11 de maio de 2017 (1)
Processo C-434/15
Associação Profissional Elite Taxi
v
Uber Systems Espanha SL
(Pedido de decisão prejudicial - Serviços no mercado interno - Transporte de passageiros - Utilização de ferramentas informáticas e de uma aplicação para telemóveis - Concorrência desleal - Necessidade de autorização)
Introdução
(Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Juzgado de lo Mercantil n.o 3 de Barcelona (Tribunal de Comércio n.o 3 de Barcelona, Espanha))
- Embora o desenvolvimento de novas tecnologias seja, em geral, uma fonte de controvérsia, a Uber é um caso à parte. O seu modo de funcionamento gera críticas e interrogações, mas também esperanças e novas expectativas. Só no domínio jurídico, o modo de funcionamento da Uber suscitou questões relativas ao direito da concorrência, à proteção dos consumidores e ao direito do trabalho, entre outras. Do ponto de vista económico e social, surgiu mesmo o termo "uberização". O presente pedido de decisão prejudicial coloca, pois, o Tribunal de Justiça perante uma questão altamente politizada e muito mediatizada.
- O objeto do presente processo é, no entanto, muito mais restrito. A interpretação que o Tribunal de Justiça é chamado a fazer deve servir apenas para verificar qual é a posição da Uber em termos de direito da UE, a fim de determinar se, e em que medida, o seu funcionamento é abrangido pelo âmbito de aplicação do direito da UE. A questão principal é, portanto, a de saber se as eventuais regras de funcionamento da Uber estão sujeitas às exigências do direito da União, em primeiro lugar as relativas à livre prestação de serviços, ou se se inserem no âmbito da competência partilhada da União Europeia e dos Estados-Membros em matéria de transportes locais, competência essa que ainda não foi exercida a nível da União. Contexto jurídico Direito da União Europeia
- O n.o 2 do artigo 1.o da Diretiva 98/34/CE (2 ) prevê:
Para efeitos da presente diretiva, entende-se por ...
- "serviço", qualquer serviço da sociedade da informação, ou seja, qualquer serviço prestado normalmente mediante remuneração, à distância, por via eletrónica e mediante pedido individual de um destinatário de serviços.
Para efeitos da presente definição:
- "à distância" significa que o serviço é prestado sem que as partes estejam simultaneamente presentes,
- "por via eletrónica": significa que o serviço é enviado inicialmente e recebido no seu destino por meio de equipamento eletrónico de processamento (incluindo a compressão digital) e de armazenamento de dados, sendo inteiramente transmitido, encaminhado e recebido por cabo, rádio, meios ópticos ou outros meios electromagnéticos,
- "a pedido individual de um destinatário de serviços" significa que o serviço é prestado através da transmissão de dados a pedido individual.
O Anexo V contém uma lista indicativa dos serviços não abrangidos por esta definição.
...'
- As alíneas a) e h) do artigo 2.o da Diretiva 2000/31/CE (3 ) prevêem:
Para efeitos da presente diretiva, os termos a seguir indicados têm o seguinte significado
(a) "serviços da sociedade da informação": serviços na aceção do nº 2 do artigo 1º da [Diretiva 98/34];
...
(h) "domínio coordenado": os requisitos estabelecidos nos sistemas jurídicos dos Estados-Membros aplicáveis aos prestadores de serviços da sociedade da informação ou aos serviços da sociedade da informação, independentemente de serem de carácter geral ou especificamente concebidos para eles.
(i) O domínio coordenado diz respeito aos requisitos que o prestador de serviços tem de cumprir em matéria de
- o acesso à atividade de um serviço da sociedade da informação, tais como requisitos relativos a qualificações, autorização ou notificação,
- o exercício da atividade de um serviço da sociedade da informação, tais como exigências relativas ao comportamento do prestador de serviços, exigências relativas à qualidade ou ao conteúdo do serviço, incluindo as aplicáveis à publicidade e aos contratos, ou exigências relativas à responsabilidade do prestador de serviços;
(ii) O domínio coordenado não abrange requisitos como:
...
- requisitos aplicáveis aos serviços não prestados por via eletrónica".
- Os nºs 1, 2 e 4 do artigo 3º da Diretiva 2000/31/CE prevêem:
'1. Cada Estado-Membro assegurará que os serviços da sociedade da informação prestados por um prestador de serviços estabelecido no seu território respeitem as disposições nacionais aplicáveis no Estado-Membro em causa que se inscrevam no domínio coordenado.
- Os Estados-Membros não podem, por razões que se inscrevam no domínio coordenado, restringir a liberdade de prestação de serviços da sociedade da informação a partir de outro Estado-Membro.
...
- Os Estados-Membros podem adotar medidas derrogatórias do n.º 2 em relação a um determinado serviço da sociedade da informação se estiverem preenchidas as seguintes condições
(a) As medidas devem ser:
(i) necessário por uma das seguintes razões:
- a ordem pública, nomeadamente a prevenção, a investigação, a deteção e a repressão de infracções penais, incluindo a proteção de menores e a luta contra qualquer incitamento ao ódio em razão da raça, do sexo, da religião ou da nacionalidade, bem como contra as violações da dignidade humana relativas a pessoas individuais,
- a proteção da saúde pública,
- segurança pública, incluindo a salvaguarda da segurança e da defesa nacionais,
- a proteção dos consumidores, incluindo os investidores;
(ii) tomadas contra um determinado serviço da sociedade da informação que prejudique os objectivos referidos na subalínea i) ou que apresente um risco sério e grave de prejudicar esses objectivos;
(iii) proporcionais a esses objectivos;
(b) Antes de tomar as medidas em questão e sem prejuízo dos processos judiciais, incluindo os processos preliminares e os actos praticados no âmbito de uma investigação criminal, o Estado-Membro tenha
- solicitou ao Estado-Membro referido no n.º 1 que tomasse medidas e este não as tomou ou tomou-as de forma inadequada,
- notificou a Comissão e o Estado-Membro referido no n.º 1 da sua intenção de adotar tais medidas.
...'
- Nos termos do n.º 2, alínea d), do artigo 2.º da Diretiva 2006/123/CE: (4)
A presente diretiva não se aplica às seguintes actividades:
...
(d) Serviços no domínio dos transportes, incluindo os serviços portuários, abrangidos pelo âmbito de aplicação do Título V do Tratado;
...'
- O artigo 3.º, n.º 1, primeiro período, da referida diretiva dispõe:
Se as disposições da presente diretiva colidirem com uma disposição de outro ato comunitário que regule aspectos específicos do acesso a uma atividade de serviços ou do seu exercício em sectores ou profissões específicos, a disposição do outro ato comunitário prevalece e aplica-se a esses sectores ou profissões específicos.
Direito espanhol
- A descrição do quadro jurídico nacional aplicável feita pelo órgão jurisdicional de reenvio, pelas partes no processo principal e pelo Governo espanhol suscita alguma confusão. Passo a expor os elementos essenciais, tal como resultam tanto da decisão de reenvio como das diferentes observações escritas apresentadas no decurso do presente processo.
- Por um lado, no que respeita à regulamentação nacional em matéria de transportes, o artigo 99.°, n.° 1, da Ley 16/1987 de Ordenación de los Transportes Terrestres, de 30 de julho de 1987, prevê a necessidade de obter uma autorização de transporte público de passageiros para efetuar esse tipo de transporte, bem como qualquer atividade de intermediação na celebração desses contratos. No entanto, a demandada no processo principal indica que a Ley 9/2013 por la que se modifica la Ley 16/1987 y la Ley 21/2003, de 7 de julio, de Seguridad Aérea (Lei 9/2013 que altera a Lei 16/1987 e a Lei 21/2003, de 7 de julho, relativa à segurança aérea), de 4 de julho de 2013, suprimiu a exigência de uma autorização específica para a prestação de serviços de transporte intermediário de passageiros. No entanto, não é claro se esta reforma foi aplicada em toda a Espanha.
- A nível regional e local, a legislação nacional é complementada, no que se refere aos serviços de táxi, por diversos regulamentos adoptados pela Comunidade Autónoma da Catalunha e pela Área Metropolitana de Barcelona, entre os quais o Reglamento Metropolitano del Taxi (Regulamento sobre os serviços de táxi na Área Metropolitana de Barcelona), adotado pelo Consell Metropolitá de l'Entitat Metropolitana de Transport de Barcelona, de 22 de julho de 2004, que exige que plataformas como a que está em causa no processo principal disponham das licenças e das autorizações administrativas necessárias para o exercício da sua atividade.
- Por último, a Ley 3/1991 de Competencia Desleal, de 10 de janeiro de 1991, define como concorrência desleal, no seu artigo 4.o , os comportamentos profissionais contrários às regras de boa fé, no seu artigo 5.o , as práticas enganosas e, no seu artigo 15.o , as infracções às regras que regem a atividade concorrencial que conferem uma vantagem competitiva no mercado. Factos, processo principal e questões prejudiciais A petição Uber
- Uber é o nome de uma plataforma eletrónica (5) desenvolvida pela Uber Technologies Inc., uma empresa com sede em São Francisco (Estados Unidos). Na União Europeia, a plataforma Uber é gerida pela Uber BV, uma empresa regida pelo direito neerlandês e uma filial da Uber Technologies.
- Com a ajuda de um smartphone equipado com a aplicação Uber, a plataforma permite aos utilizadores solicitar serviços de transporte urbano nas cidades por ela abrangidas. A aplicação reconhece a localização do utilizador e encontra os motoristas disponíveis que se encontram nas proximidades. Quando um motorista aceita uma viagem, a aplicação notifica o utilizador dessa aceitação e apresenta o perfil do motorista, juntamente com uma tarifa estimada para o destino indicado pelo utilizador. Uma vez concluída a viagem, a tarifa é automaticamente debitada no cartão bancário que o utilizador deve introduzir ao inscrever-se na aplicação. A aplicação contém igualmente uma função de classificação que permite aos condutores serem classificados pelos passageiros e aos passageiros serem classificados pelos condutores. O facto de a média das classificações ser inferior a um determinado limiar pode implicar a exclusão da plataforma.
- Os serviços de transporte oferecidos pela plataforma Uber dividem-se em diferentes categorias, consoante a qualidade dos motoristas e o tipo de veículo. De acordo com as informações fornecidas pela demandada no processo principal, está em causa neste processo um serviço denominado UberPop, através do qual motoristas privados não profissionais transportam passageiros com os seus próprios veículos.
- A tabela tarifária é estabelecida pelo operador da plataforma em função da distância e da duração da viagem. A tarifa varia em função do nível de procura num dado momento, pelo que, nas horas de ponta, pode exceder várias vezes a tarifa de base. A tarifa é calculada pela aplicação e cobrada automaticamente pelo operador da plataforma, que retém uma parte da sua taxa, normalmente entre 201 e 251 TTP3, e paga o restante ao condutor. Os principais procedimentos
- A Asociación Profesional Elite Taxi (a seguir "Elite Taxi") é uma organização profissional que representa os motoristas de táxi da cidade de Barcelona (Espanha). Em 29 de outubro de 2014, a Elite Taxi interpôs uma ação no Juzgado de lo Mercantil n.° 3 de Barcelona (Tribunal de Comércio n.° 3 de Barcelona, Espanha), pedindo ao tribunal, designadamente, que condenasse a Uber Systems Spain SL (a seguir "Uber Spain"), sociedade de direito espanhol, a declarar que as suas actividades, que alegadamente violam a legislação em vigor e constituem práticas enganosas, são actos de concorrência desleal ordenar-lhe que cesse o seu comportamento desleal que consiste em apoiar outras sociedades do grupo através da prestação de serviços de reserva a pedido por meio de dispositivos móveis e da Internet, quando tal esteja direta ou indiretamente ligado à utilização da plataforma digital Uber em Espanha; e proibi-la de exercer tais actividades no futuro. Segundo as conclusões do órgão jurisdicional de reenvio, nem a Uber Espanha nem os proprietários ou os condutores dos veículos em causa dispõem das licenças e autorizações exigidas pelo regulamento relativo aos serviços de táxi na área metropolitana de Barcelona.
- A Uber Espanha nega ter cometido qualquer infração à legislação em matéria de transportes. Alega que é a sociedade de direito neerlandês, Uber BV, que explora a aplicação Uber na União Europeia, incluindo em Espanha, e que, por conseguinte, as pretensões da recorrente devem ser dirigidas a essa sociedade. A Uber Espanha alega que apenas exerce funções de publicidade em nome da Uber BV. Repetiu estas afirmações nas suas observações no presente processo.
- Uma vez que se trata de uma questão de facto, cabe ao órgão jurisdicional de reenvio decidir qual das duas empresas acima referidas deve ser a destinatária de uma eventual injunção. Parti, no entanto, do princípio de que a empresa Uber BV explora a aplicação Uber na União Europeia. (6) É nesta premissa - que não é isenta de consequências do ponto de vista do direito da UE - que se baseará a minha análise. No presente parecer, utilizarei o termo "Uber" para me referir à plataforma eletrónica de reservas, bem como ao seu operador.
- Além disso, devo salientar que, no que diz respeito ao objeto do processo principal, não se trata aqui de bloquear a aplicação Uber nos smartphones ou de a tornar inutilizável de qualquer outra forma. Não foi pedida nenhuma ordem ou qualquer outra medida para esse efeito. No processo principal, o único ponto em causa é a possibilidade de a Uber prestar o serviço UberPop na cidade de Barcelona através da referida aplicação. Questões prejudiciais e tramitação no Tribunal de Justiça
- O Juzgado Mercantil n.º 3 de Barcelona, por considerar necessária uma interpretação de várias disposições do direito da União Europeia para se poder pronunciar sobre o processo que lhe foi submetido, decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais
"1) Na medida em que o artigo 2.o , n.o 2, alínea d), da Diretiva 2006/123 exclui as actividades de transporte do âmbito de aplicação desta diretiva, a atividade exercida com fins lucrativos pela recorrida, que consiste em servir de intermediário entre o proprietário de um veículo e uma pessoa que necessita de efetuar um trajeto no interior de uma cidade, gerindo os meios informáticos - nas palavras da recorrida, interface "smartphone e plataforma tecnológica" e aplicação informática - que lhes permitem ligar-se entre si, deve ser considerada um simples serviço de transporte ou deve ser considerada um serviço de intermediação eletrónica ou um serviço da sociedade da informação, na aceção do artigo 1.o , n.o 2, da Diretiva 98/34?
(2) No âmbito da identificação da natureza jurídica dessa atividade, pode considerar-se que se trata ... em parte, de um serviço da sociedade da informação e, em caso afirmativo, deve o serviço de intermediação eletrónica beneficiar do princípio da livre prestação de serviços garantido pela legislação [comunitária] - artigo 56.o TFUE e Diretivas [2006/123] e ... [2000/31]?
(3) Se o serviço prestado pela [Uber Espanha] não for considerado um serviço de transporte e, portanto, for considerado abrangido pelos casos previstos na Diretiva 2006/123, o artigo 15.o da Lei da concorrência desleal - relativo à violação das regras que regem a atividade concorrencial - é contrário à Diretiva 2006/123? mais concretamente o artigo 9.o , relativo à liberdade de estabelecimento e aos regimes de autorização, quando a remissão para as leis ou disposições legais nacionais é feita sem ter em conta que o regime de obtenção de licenças, autorizações e permissões não pode ser de modo algum restritivo ou desproporcionado, ou seja, não pode entravar injustificadamente o princípio da liberdade de estabelecimento?
(4) Se se confirmar que a Diretiva [2000/31] é aplicável ao serviço prestado pela [Uber Espanha], as restrições num Estado-Membro à liberdade de prestar o serviço de intermediação eletrónica a partir de outro Estado-Membro, sob a forma de subordinar o serviço a uma autorização ou licença, ou sob a forma de uma injunção que proíba a prestação do serviço de intermediação eletrónica com base na aplicação da legislação nacional em matéria de concorrência desleal, são medidas válidas que constituem derrogações ao artigo 3.o , n.o 2, da Diretiva [2000/31], nos termos do seu artigo 3.o , n.o 4?
- O pedido de decisão prejudicial deu entrada no Tribunal de Justiça em 7 de agosto de 2015. Foram apresentadas observações escritas pelas partes no processo principal, pelos Governos espanhol, finlandês, francês e grego, pelos Governos irlandês, neerlandês e polaco, pela Comissão Europeia e pelo Órgão de Fiscalização da Associação Europeia de Comércio Livre (EFTA). Com exceção do Governo grego, estas partes interessadas, bem como o Governo estónio, estiveram representados na audição realizada em 29 de novembro de 2016. Análise
- O órgão jurisdicional de reenvio submete quatro questões prejudiciais: as duas primeiras dizem respeito à qualificação da atividade da Uber à luz das Diretivas 2000/31 e 2006/123, bem como do Tratado FUE, ao passo que as duas segundas se referem às conclusões que devem, eventualmente, ser retiradas dessa qualificação. A classificação da atividade da Uber
- Nas suas duas primeiras questões, o tribunal nacional pergunta essencialmente se a atividade da Uber é abrangida pelo âmbito de aplicação das Diretivas 2006/123 e 2000/31, bem como pelas disposições do Tratado FUE relativas à livre prestação de serviços.
- Para responder a estas questões, é necessário, em primeiro lugar, analisar esta atividade à luz do sistema estabelecido pela Diretiva 2000/31 e da definição de "serviço da sociedade da informação" constante do n.º 2 do artigo 1.º da Diretiva 98/34, definição para a qual remete a alínea a) do artigo 2.
- Em segundo lugar, será necessário determinar se essa atividade é um serviço de transporte ou um serviço no domínio dos transportes, na aceção do artigo 58.o, n.o 1, do TFUE e do artigo 2.o, n.o 2, alínea d), da Diretiva 2006/123. A livre circulação de serviços no domínio dos transportes é assegurada no âmbito da política comum de transportes (7), pelo que esses serviços estão excluídos do âmbito de aplicação da Diretiva 2006/123, nos termos da disposição acima referida. A atividade da Uber à luz da Diretiva 2000/31
- A fim de avaliar se a atividade da Uber é abrangida pelo âmbito de aplicação da Diretiva 2000/31, deve ser feita referência à definição de serviços da sociedade da informação constante do artigo 2.o , alínea a), dessa diretiva. A definição remete para o artigo 1.º, n.º 2, da Diretiva 98/34.
- Nos termos desta última disposição, um serviço da sociedade da informação é um serviço prestado mediante remuneração, à distância, por via eletrónica e a pedido individual de um destinatário. A questão de saber se um serviço é remunerado e se é prestado mediante pedido individual não parece ser problemática. No entanto, o mesmo não se pode dizer do teste que determina se um serviço é prestado à distância por meios electrónicos.
- Como foi sucintamente explicado na secção relativa aos factos do processo principal, a Uber permite essencialmente localizar um motorista, através de uma aplicação para smartphone, e ligá-lo a um potencial passageiro, com o objetivo de fornecer um transporte urbano a pedido. Estamos, portanto, perante um serviço misto, uma vez que uma parte é fornecida por via eletrónica e a outra parte, por definição, não o é. A questão é saber se esse serviço é abrangido pelo âmbito de aplicação da Diretiva 2000/31.
- Serviços compostos ao abrigo da Diretiva 2000/31
- A Diretiva 2000/31 tem por objetivo garantir a eficácia da liberdade de prestação de serviços da sociedade da informação. Estes serviços são definidos, no artigo 2.°, alínea a), da diretiva, por referência ao artigo 1.°, n.° 2, da Diretiva 98/34. Nos termos desta última disposição, os serviços da sociedade da informação são, nomeadamente, "inteiramente transmitidos, encaminhados e recebidos por fios, rádio, meios ópticos ou outros meios electromagnéticos". (8)
- Naturalmente, algumas prestações incluem componentes que não são transmitidos por meios electrónicos, porque não podem ser desmaterializados. A venda em linha de bens materiais é um bom exemplo disso, uma vez que se insere necessariamente no âmbito dos serviços da sociedade da informação, de acordo com o considerando 18 da Diretiva 2000/31. A Diretiva 2000/31 estabelece igualmente que o domínio coordenado, ou seja, o conjunto das regras jurídicas aplicáveis a um serviço da sociedade da informação e com base nas quais os Estados-Membros não podem, em princípio, restringir as actividades dos prestadores estabelecidos noutros Estados-Membros, não abrange as exigências aplicáveis aos serviços que não sejam prestados por via eletrónica. (9) Os Estados-Membros são, por conseguinte, livres, dentro dos limites que podem ser impostos por outras disposições do direito comunitário, de restringir a liberdade dos prestadores por força de regras relativas a serviços não prestados por via eletrónica. (10)
- No entanto, para que a Diretiva 2000/31 atinja o seu objetivo de liberalização dos serviços da sociedade da informação, uma liberalização limitada apenas à componente eletrónica deve ter um impacto real na possibilidade de exercício da atividade. É por esta razão que o legislador se concentrou nos serviços que são, em princípio, inteiramente transmitidos por via eletrónica, sendo as eventuais prestações que possam ser efectuadas por outros meios meramente acessórias a esses serviços. Com efeito, não faria sentido liberalizar apenas um aspeto secundário de uma prestação composta se esta prestação não pudesse ser livremente efectuada devido a regras não abrangidas pelo âmbito de aplicação das disposições da Diretiva 2000/31. Esta aparente liberalização não só não atingiria o seu objetivo, como também teria consequências negativas, provocando insegurança jurídica e diminuição da confiança na legislação comunitária.
- Por esta razão, uma interpretação da noção de serviços da sociedade da informação que inclua no seu âmbito de aplicação actividades em linha sem valor económico próprio seria ineficaz para a realização do objetivo prosseguido pela Diretiva 2000/31.
- No caso dos serviços compostos, ou seja, dos serviços que incluem elementos electrónicos e não electrónicos, pode considerar-se que um serviço é inteiramente transmitido por via eletrónica, em primeiro lugar, quando a prestação que não é efectuada por via eletrónica é economicamente independente do serviço que é prestado por essa via.
- Esta situação ocorre, em particular, quando um prestador de serviços intermediário facilita as relações comerciais entre um utilizador e um prestador de serviços independente (ou vendedor). As plataformas para a compra de voos ou reservas de hotéis são um exemplo desta situação. Nestes casos, a oferta feita pelo intermediário representa um verdadeiro valor acrescentado tanto para o utilizador como para o comerciante em causa, mas permanece economicamente independente, uma vez que o comerciante exerce a sua atividade separadamente.
- Em contrapartida, quando o prestador do serviço prestado por via eletrónica é também o prestador do serviço não prestado por essa via ou quando exerce uma influência determinante sobre as condições de prestação deste último serviço, de modo que os dois serviços formam um todo indissociável, penso que é necessário identificar a componente principal da prestação em causa, ou seja, a componente que lhe dá sentido em termos económicos. Para que um serviço possa ser classificado como um serviço da sociedade da informação, esta componente principal deve ser realizada por meios electrónicos.
- É o caso, por exemplo, da venda de bens em linha. Com efeito, nas vendas em linha, os elementos essenciais da transação, a saber, a apresentação da oferta e a sua aceitação pelo comprador, a celebração do contrato e, na maior parte das vezes, o pagamento, são efectuados por via eletrónica e são abrangidos pela definição de serviço da sociedade da informação. Foi esta a conclusão do Tribunal de Justiça no seu acórdão Ker-Optika. (11) A entrega dos bens adquiridos é simplesmente o cumprimento de uma obrigação contratual, pelo que as regras aplicáveis à entrega não devem, em princípio, afetar a prestação do serviço principal.
- No entanto, não me parece que a Diretiva 2000/31 deva ser interpretada no sentido de que qualquer atividade em linha relacionada com o comércio, seja ela de natureza meramente acessória, secundária ou preparatória, que não seja economicamente independente, seja, por si só, um serviço da sociedade da informação.
- Passo agora a analisar a atividade da Uber à luz das considerações anteriores.
- Atividade da Uber
- O resultado desta análise dependerá, em grande medida, da questão de saber se a atividade da Uber deve ser considerada como um todo que compreende, por um lado, uma prestação de serviços em que passageiros e condutores estão ligados entre si através da plataforma eletrónica e, por outro, a prestação de serviços de transporte em sentido estrito, ou se estas duas prestações devem ser consideradas como dois serviços distintos. Começarei por analisar esta questão.
- Ao classificar uma atividade à luz das disposições legais relevantes, devem ser feitas algumas suposições factuais. Dado que as informações factuais fornecidas pelo órgão jurisdicional de reenvio são incompletas e que o serviço em causa foi suspenso em Espanha na sequência de várias injunções, a minha análise basear-se-á nas informações disponíveis sobre os métodos de funcionamento da Uber noutros países. (12) Estes métodos de funcionamento são sensivelmente semelhantes. Em todo o caso, cabe ao órgão jurisdicional de reenvio proceder às apreciações factuais definitivas.
- O que é a Uber? É uma empresa de transportes, uma empresa de táxis, para ser franco? Ou é apenas uma plataforma eletrónica que permite aos utilizadores localizar, reservar e pagar por um serviço de transporte prestado por outra pessoa?
- A Uber é frequentemente descrita como uma empresa (ou plataforma) da economia "colaborativa". Penso que não vale a pena discutir aqui o significado exato deste termo. (13) O que é relevante no que diz respeito à Uber é que não pode certamente ser considerada uma plataforma de partilha de boleias. (14) Os motoristas da plataforma Uber oferecem aos passageiros um serviço de transporte para um destino selecionado pelo passageiro e, consequentemente, são remunerados por um montante que excede largamente o mero reembolso das despesas efectuadas. Trata-se, por conseguinte, de um serviço de transporte tradicional. O facto de ser ou não considerado como fazendo parte de uma "economia colaborativa" é irrelevante para a sua classificação nos termos da lei em vigor.
- Nas suas observações escritas, a Uber afirma que se limita a fazer corresponder a oferta (a oferta de transportes urbanos) à procura. Penso, no entanto, que esta é uma visão demasiado limitada do seu papel. A Uber faz, de facto, muito mais do que adequar a oferta à procura: é ela própria que cria a oferta. Além disso, estabelece regras sobre as caraterísticas essenciais da oferta e organiza o seu funcionamento.
- A Uber permite que as pessoas que pretendam exercer a atividade de transporte urbano de passageiros se liguem à sua aplicação e exerçam essa atividade sujeita aos termos e condições impostos pela Uber, que são vinculativos para os condutores através do contrato de utilização da aplicação. Os termos e condições são numerosos. Abrangem tanto o acesso como o exercício da atividade e até o comportamento dos condutores na prestação dos serviços.
- Assim, para aceder à aplicação Uber como condutor, é necessário ter um automóvel. (15) Os veículos autorizados a conduzir em nome da Uber devem satisfazer determinadas condições que parecem variar consoante o país e a cidade. No entanto, regra geral, devem ser veículos de passageiros de quatro ou cinco portas, sujeitos, pelo menos, a um limite de idade. Os veículos devem ter passado por uma inspeção técnica e cumprir as disposições relativas ao seguro obrigatório. (16)
- Os condutores devem, obviamente, ser titulares de uma carta de condução (detida durante um determinado período) e não ter registo criminal. Em alguns países, é igualmente exigida uma lista de infracções de trânsito.
- Embora não existam regras sobre o tempo de trabalho no âmbito da plataforma Uber, para que os motoristas possam exercer essa atividade a par de outras, verifica-se que a maioria das viagens é realizada por motoristas para os quais a Uber é a sua única ou principal atividade profissional. Os motoristas também recebem uma recompensa financeira da Uber se acumularem um grande número de viagens. Para além disso, a Uber informa os condutores de onde e quando podem contar com um elevado volume de viagens e/ou tarifas preferenciais. Assim, sem exercer quaisquer restrições formais sobre os condutores, a Uber pode adaptar a sua oferta às flutuações da procura.
- A aplicação Uber contém uma função de classificação que permite aos condutores serem classificados pelos passageiros e vice-versa. Uma pontuação média inferior a um determinado limiar pode resultar na exclusão da plataforma, especialmente para os condutores. A Uber exerce, assim, um controlo, ainda que indireto, sobre a qualidade dos serviços prestados pelos condutores.
- Por fim, é a Uber que estabelece o preço do serviço prestado. Esse preço é calculado com base na distância e na duração da viagem, registadas pela aplicação através do GPS. Em seguida, um algoritmo ajusta o preço à intensidade da procura, aplicando um multiplicador adequado à tarifa de base quando a procura aumenta devido, por exemplo, a um evento ou a uma simples alteração das condições climatéricas, como uma tempestade.
- Embora os representantes da Uber tenham afirmado na audição que os condutores são, em princípio, livres de pedir uma tarifa mais baixa do que a indicada pela aplicação, não me parece que esta seja uma opção verdadeiramente viável para os condutores. Embora os condutores tenham teoricamente essa possibilidade, a taxa que a Uber cobra é o montante resultante da tarifa calculada pela aplicação. Uma vez que qualquer redução da tarifa paga pelo passageiro é feita em detrimento do condutor, é pouco provável que os condutores exerçam esse poder discricionário. (17) Por conseguinte, penso que é difícil negar que a tarifa é fixada pela Uber.
- Assim, a Uber exerce controlo sobre todos os aspectos relevantes de um serviço de transporte urbano: sobre o preço, obviamente, mas também sobre as condições mínimas de segurança através de requisitos prévios relativos aos motoristas e aos veículos, sobre a acessibilidade da oferta de transporte, incentivando os motoristas a trabalharem quando e onde a procura é elevada, sobre o comportamento dos motoristas através do sistema de classificação e, por último, sobre a eventual exclusão da plataforma. Os outros aspectos são, na minha opinião, de importância secundária na perspetiva de um utilizador médio de serviços de transporte urbano e não influenciam as suas escolhas económicas. Assim, a Uber controla os aspectos economicamente significativos do serviço de transporte oferecido através da sua plataforma.
- Embora este controlo não seja exercido no contexto de uma relação tradicional empregador-empregado, não nos devemos deixar enganar pelas aparências. Um controlo indireto como o exercido pela Uber, baseado em incentivos financeiros e em classificações descentralizadas, conduzidas pelos passageiros, com um efeito de escala (18), permite uma gestão tão ou mais eficaz do que uma gestão baseada em ordens formais dadas por um empregador aos seus empregados e no controlo direto da execução dessas ordens.
- Pelo exposto, concluo que a atividade da Uber compreende uma única prestação de transporte num veículo localizado e reservado através da aplicação para smartphone e que este serviço é prestado, do ponto de vista económico, (19) pela Uber ou em seu nome. O serviço é também apresentado aos utilizadores, e por eles percepcionado, desta forma. Quando os utilizadores decidem utilizar os serviços da Uber, estão à procura de um serviço de transporte que ofereça determinadas funções e um determinado padrão de qualidade. Essas funções e a qualidade do transporte são asseguradas pela Uber.
- Esta constatação não significa, contudo, que os motoristas da Uber devam necessariamente ser considerados como seus empregados. A empresa pode muito bem prestar os seus serviços através de comerciantes independentes que actuam em seu nome como subcontratantes. A controvérsia em torno do estatuto dos motoristas em relação à Uber, que já deu origem a decisões judiciais em alguns Estados-Membros (20), não tem qualquer relação com as questões jurídicas submetidas ao Tribunal de Justiça no presente processo.
- O mesmo se aplica à questão da propriedade dos veículos. O facto de a Uber não ser a proprietária é, a meu ver, irrelevante, uma vez que um comerciante pode perfeitamente prestar serviços de transporte utilizando veículos pertencentes a terceiros, sobretudo se recorrer a esses terceiros para a realização desses serviços, independentemente da natureza da relação jurídica que liga as duas partes.
- Por outro lado, considero que a conclusão feita imediatamente acima impede que a Uber seja tratada como um mero intermediário entre condutores e passageiros. Os motoristas que trabalham na plataforma Uber não exercem uma atividade autónoma que exista independentemente da plataforma. Pelo contrário, a atividade existe apenas em função da plataforma, (21) sem a qual não teria qualquer sentido.
- É por isso que considero incorreto comparar a Uber com plataformas de intermediação, como as utilizadas para fazer reservas de hotéis ou comprar voos.
- As semelhanças são evidentes, por exemplo, no que diz respeito aos mecanismos de reserva ou de compra diretamente na plataforma, às facilidades de pagamento ou ainda aos sistemas de classificação. Estes são serviços oferecidos pela plataforma aos seus utilizadores.
- No entanto, ao contrário do que acontece com os motoristas da Uber, tanto os hotéis como as companhias aéreas são empresas que funcionam de forma totalmente independente de qualquer plataforma intermediária e para as quais essas plataformas são apenas uma das várias formas de comercializar os seus serviços. Além disso, são os hotéis e as companhias aéreas - e não as plataformas de reserva - que determinam as condições em que os seus serviços são prestados, a começar pelos preços. (22) Estas empresas também operam de acordo com as regras específicas do seu sector de atividade, pelo que as plataformas de reserva não exercem qualquer controlo prévio sobre o acesso à atividade, tal como a Uber faz com os seus motoristas.
- Por último, estas plataformas de reserva oferecem aos utilizadores uma verdadeira escolha entre vários fornecedores cujas ofertas diferem em vários pontos importantes do ponto de vista dos utilizadores, tais como as normas de voo e de alojamento, os horários de voo e a localização do hotel. Em contrapartida, com a Uber, estes aspectos são normalizados e determinados pela plataforma, pelo que, regra geral, o passageiro aceitará o serviço do motorista mais rapidamente disponível.
- A Uber não é, portanto, um mero intermediário entre os motoristas que querem oferecer serviços de transporte ocasionalmente e os passageiros que procuram esses serviços. Pelo contrário, a Uber é um verdadeiro organizador e operador de serviços de transporte urbano nas cidades em que está presente. Se é verdade, como a Uber afirma nas suas observações no processo, que o seu conceito é inovador, essa inovação não deixa de ser do domínio dos transportes urbanos.
- Devo ainda referir que a classificação da Uber como uma plataforma que agrupa prestadores de serviços independentes pode levantar questões do ponto de vista do direito da concorrência. (23) No entanto, não desenvolverei mais este ponto, uma vez que ultrapassa os limites do presente caso.
- No sistema operativo da Uber, a ligação entre potenciais passageiros e motoristas não tem, portanto, qualquer valor económico próprio, porque, como se explicou acima, os motoristas que trabalham para a Uber não exercem - pelo menos quando conduzem no contexto dos serviços da Uber - uma atividade económica independente. No âmbito desse serviço, em primeiro lugar, os motoristas da Uber só podem localizar passageiros através da aplicação Uber e, em segundo lugar, essa aplicação só permite localizar os motoristas que trabalham na plataforma. Assim, um é inseparável do outro e, em conjunto, formam um único serviço. Também não me parece que o fornecimento de transporte em sentido estrito possa ser considerado de importância secundária.
- É verdade que o carácter inovador da plataforma Uber assenta, em grande medida, na utilização de novas tecnologias, como o GPS e os smartphones, para organizar o transporte urbano. No entanto, a inovação não se fica por aqui: estende-se também à organização do próprio transporte, sem a qual a Uber seria uma mera aplicação de reserva de táxis. Assim, no contexto deste serviço, é sem dúvida a oferta de transporte que é a principal oferta e que dá sentido económico ao serviço. Os utilizadores procuram os motoristas com um único objetivo: serem transportados de A para B. Assim, a fase de conexão é meramente preparatória para que a prestação principal possa ser realizada nas melhores condições possíveis.
- A oferta de ligação entre passageiros e motoristas não é, portanto, nem autónoma nem principal em relação à oferta de transporte. Por conseguinte, não pode ser classificada como um "serviço da sociedade da informação". Uma tal classificação não permitiria atingir os objectivos de liberalização subjacentes à Diretiva 2000/31, porque, mesmo que a atividade de ligação fosse liberalizada, os Estados-Membros seriam livres de inviabilizar o seu exercício impondo regras à atividade de transporte. Assim, o único resultado de tal liberalização seria que o Estado-Membro em que o prestador de serviços está estabelecido poderia beneficiar desse estabelecimento (em termos de investimentos, novos postos de trabalho e receitas fiscais), impedindo simultaneamente a prestação do serviço no seu território ao abrigo das regras aplicáveis às prestações não abrangidas pela Diretiva 2000/31. (24) Tal situação poria em causa toda a lógica da livre prestação de serviços da sociedade da informação organizada pela diretiva, que se baseia no controlo da legalidade das operações do prestador pelo Estado-Membro onde este se encontra estabelecido e no reconhecimento desse controlo pelos outros Estados-Membros. (25)
- A situação acima descrita, em que o funcionamento da plataforma não é formalmente proibido mas, devido ao modelo real utilizado pelo serviço UberPop, baseado em motoristas não profissionais, a atividade de transporte não pode ser exercida em conformidade com a lei, tem outro efeito indesejado. Ficou demonstrado que a Uber utiliza uma série de métodos, noticiados na imprensa, para impedir que as autoridades fiscalizem os seus motoristas, como a desconexão temporária da aplicação em algumas zonas. A Uber também oferece assistência jurídica e financeira aos motoristas que tenham sido penalizados por prestarem serviços de transporte sem a devida autorização. Os próprios condutores têm várias formas de escapar aos controlos. (26) Assim, esta liberalização incompleta - ou simplesmente aparente -, em que uma componente de uma atividade composta é liberalizada enquanto outra permanece regulamentada, cria insegurança jurídica, dando origem a zonas cinzentas e incentivando as infracções à lei. A atividade da Uber à luz da Diretiva 2006/123
- Não é surpreendente que a atividade da Uber, tal como descrita nos pontos anteriores, nomeadamente como uma prestação única que inclui tanto a identificação de um condutor disponível e a reserva de viagens como a prestação de transporte stricto sensu, possa ser considerada um serviço no domínio dos transportes na aceção do artigo 2.º, n.º 2, alínea d), da Diretiva 2006/123.
- Embora a redação desta disposição, que exclui os "serviços no domínio dos transportes" do âmbito de aplicação da Diretiva 2006/123, não pareça, por si só, suficiente para chegar a tal conclusão, o considerando 21 da diretiva não deixa dúvidas, uma vez que indica que os serviços em questão incluem "os transportes urbanos [e] os táxis". Por conseguinte, não é necessário entrar em discussões sobre se os serviços da Uber constituem um tipo de serviço de táxi: todas as formas de transporte urbano são mencionadas e a Uber é certamente uma delas.
- A atividade da Uber deverá igualmente ser classificada como abrangida pelo âmbito de aplicação da exceção à liberdade de prestação de serviços prevista no artigo 58.º, n.º 1, do TFUE e estar sujeita às regras previstas nos artigos 90.º e seguintes do TFUE. DO TFUE. O artigo 91.º, n.º 1, alínea b), do TFUE menciona expressamente as "condições em que os transportadores não residentes podem efetuar serviços de transporte num Estado-Membro" como um domínio em que devem ser estabelecidas regras no âmbito da política comum de transportes. Se se admitir, como afirmei, que a Uber presta serviços de transporte urbano, deve então ser considerada, se não como um transportador em sentido estrito, pelo menos como um organizador de serviços de transporte.
- Assim, sem que seja sequer necessário examinar o acórdão Grupo Itevelesa e o. (27), que o órgão jurisdicional de reenvio mencionou na sua decisão de reenvio, há que concluir que a atividade da Uber constitui um serviço no domínio dos transportes na aceção do artigo 2.o, n.o 2, alínea d), da Diretiva 2006/123. Por conseguinte, está excluída do âmbito de aplicação desta diretiva. Além disso, a atividade da Uber está abrangida pela exceção à livre prestação de serviços prevista no artigo 58.º, n.º 1, TFUE e é regida pelas disposições dos artigos 90.º e seguintes do TFUE. TFUE. Conclusão sobre a primeira e a segunda questões prejudiciais
- Resumindo as considerações anteriores, sou de opinião que, no caso de serviços compostos, constituídos por uma componente fornecida por meios electrónicos e outra componente não fornecida por esses meios, a primeira componente deve ser economicamente independente da segunda ou a componente principal das duas para poder ser classificada como "serviço da sociedade da informação". A atividade da Uber deve ser considerada como um todo que engloba tanto o serviço de ligação entre passageiros e motoristas através da aplicação para smartphone como a própria oferta de transporte, que constitui, de um ponto de vista económico, a componente principal. Esta atividade não pode, portanto, ser dividida em duas, para efeitos de classificação de uma parte do serviço como serviço da sociedade da informação. Por conseguinte, o serviço deve ser classificado como um "serviço no domínio dos transportes".
- Proponho, por conseguinte, que o Tribunal de Justiça responda às primeira e segunda questões prejudiciais do seguinte modo
- O artigo 2.o , alínea a), da Diretiva 2000/31, lido em conjugação com o artigo 1.o ,n.o 2, da Diretiva 98/34, deve ser interpretado no sentido de que um serviço que liga, através de um software de telefonia móvel, potenciais passageiros a condutores que oferecem um transporte urbano individual a pedido, quando o prestador do serviço exerce um controlo sobre as condições essenciais que regem a oferta de transporte efectuada nesse contexto, nomeadamente o preço, não constitui um serviço da sociedade da informação na aceção das referidas disposições.
- O artigo 58.°, n.° 1, do TFUE e o artigo 2.°, n.° 2, alínea d), da Diretiva 2006/123 devem ser interpretados no sentido de que o serviço descrito no ponto anterior constitui um serviço de transporte na aceção destas disposições.
- Compete, evidentemente, ao órgão jurisdicional de reenvio apreciar, à luz dos seus próprios elementos de facto, se a atividade em causa no processo principal preenche o critério do controlo acima referido. No entanto, constato que vários tribunais de diferentes Estados-Membros já se pronunciaram nesse sentido. (28) Tal poderá servir de orientação para o órgão jurisdicional de reenvio, no espírito de uma rede de justiça. Observações finais
- Tendo em conta as respostas que propus às primeira e segunda questões prejudiciais, as terceira e quarta questões tornaram-se irrelevantes. Nas minhas observações finais, gostaria, no entanto, de analisar os efeitos jurídicos da possibilidade de classificar as prestações fornecidas pela Uber como um serviço autónomo, limitado a ligar passageiros e condutores entre si, que não abrangeria, portanto, a prestação de serviços de transporte em sentido estrito. Um tal serviço seria, sem dúvida, tratado como um "serviço da sociedade da informação", mas não me parece necessário abordar a questão de saber se esse serviço se insere no domínio dos transportes. O serviço de ligação como serviço da sociedade da informação
- Recapitulando, o n.º 2 do artigo 1.º da Diretiva 98/34 estabelece que um serviço da sociedade da informação é um serviço prestado mediante remuneração, à distância, por via eletrónica e mediante pedido individual de um destinatário. Um serviço que ligue potenciais passageiros e condutores entre si através de uma aplicação para smartphone satisfaz certamente estes critérios.
- No que respeita ao carácter remunerado do serviço, no sistema Uber, uma parte da tarifa paga pelo passageiro reverte a favor do operador da plataforma. O serviço de ligação é, assim, remunerado pelo passageiro uma vez concluída a prestação do transporte.
- Este serviço, analisado separadamente da prestação de serviços de transporte, é igualmente prestado à distância, uma vez que as duas partes, a Uber e o destinatário do serviço, não se encontram simultaneamente presentes. É realizado com o auxílio de uma aplicação para smartphone que funciona através da Internet, o que está claramente abrangido pela noção de prestação por via eletrónica. Com efeito, é a única forma de reservar uma viagem na plataforma Uber. Por último, o serviço é prestado não de forma contínua, mas a pedido do destinatário.
- O serviço da Uber, tal como descrito no ponto 74 do presente parecer, é, por conseguinte, abrangido pelo âmbito de aplicação das disposições da Diretiva 2000/31.
- Uma vez que a aplicação Uber é gerida e fornecida, tanto a condutores como a passageiros, no território da União Europeia pela empresa Uber BV, estabelecida nos Países Baixos, noutros Estados-Membros, incluindo Espanha, essa prestação é efectuada no âmbito da liberdade de prestação de serviços, regida, nomeadamente, pelos n.os 2 e 4 do artigo 3.o da Diretiva 2000/31.
- Nos termos destas disposições, os Estados-Membros não podem, em princípio, restringir a livre prestação de serviços de outros Estados-Membros, por razões que se inscrevam no domínio coordenado, através da introdução de exigências, quer estas sejam especificamente concebidas para os serviços da sociedade da informação, quer sejam de carácter geral. O domínio coordenado abrange, nomeadamente, nos termos do artigo 2.o , alínea h), subalínea i), primeiro travessão, da Diretiva 2000/31, as exigências relativas "ao exercício da atividade [...], tais como as exigências relativas [...] à autorização [...]". Em contrapartida, o terceiro travessão da alínea h), subalínea ii), do artigo 2.o prevê que o domínio coordenado não abrange "as exigências aplicáveis aos serviços não prestados por via eletrónica".
- Daqui decorre que a exigência de autorização para a prestação de serviços de intermediação na celebração de contratos de transporte urbano a pedido, caso ainda esteja em vigor (29) e na medida em que se aplique ao serviço de ligação prestado pela plataforma Uber, seria abrangida pelo âmbito de aplicação do domínio coordenado e, por conseguinte, pela proibição prevista no n.o 2 do artigo 3.o da Diretiva 2000/31. Em contrapartida, todas as exigências aplicáveis aos motoristas, tanto no que diz respeito ao acesso à atividade de transporte como ao seu exercício, não são abrangidas pelo domínio coordenado e, consequentemente, pela proibição, uma vez que o serviço de transporte, pela sua própria natureza, não é prestado por meios electrónicos.
- Nos termos do n.º 4 do artigo 3.º da Diretiva 2000/31, os Estados-Membros podem tomar medidas derrogatórias à liberdade de prestação de serviços da sociedade da informação, se forem necessárias por razões de ordem pública, saúde pública, segurança pública ou defesa dos consumidores.
- Embora a quarta questão prejudicial diga precisamente respeito à justificação das medidas internas em causa, o órgão jurisdicional de reenvio não indica no seu pedido as razões que poderiam justificar a sujeição da atividade de intermediação no domínio dos transportes a uma autorização. Nas suas observações, o Governo espanhol invoca razões como a gestão do tráfego e a segurança rodoviária. No entanto, estas razões parecem ser mais susceptíveis de justificar as exigências impostas aos motoristas que prestam serviços de transporte.
- No que se refere especificamente aos serviços intermediários, a única razão avançada pelo Governo espanhol que poderia aplicar-se à Uber é a que se refere à transparência na fixação dos preços, que se insere no âmbito da proteção dos consumidores. Recordo que, no sistema Uber, a tarifa não é fixada pelo condutor mas pela plataforma. No entanto, parece-me que essa transparência poderia ser assegurada por meios menos restritivos do que a exigência de autorização para a atividade de intermediação, como uma obrigação de informação aos passageiros. Tal exigência não cumpriria, assim, o critério da proporcionalidade, expressamente previsto no artigo 3.º, n.º 4, alínea a), subalínea iii), da Diretiva 2000/31.
- A complexidade da ação no processo principal resulta, no entanto, do facto de o seu objetivo consistir em obter a aplicação de sanções à Uber por alegados actos de concorrência desleal relativamente aos membros da recorrente. (30) Estes actos resultam não só do facto de a Uber ter exercido a atividade de intermediário na celebração de contratos de transporte sem dispor da autorização necessária, mas também do facto de os motoristas que prestam serviços de transporte no âmbito da plataforma Uber não satisfazerem as condições previstas na legislação espanhola aplicável a esses serviços. Estas condições não estão abrangidas pela Diretiva 2000/31 nem pela Diretiva 2006/123, uma vez que se inserem indubitavelmente no domínio dos transportes.
- As disposições da Diretiva 2000/31 impedem, por conseguinte, a aplicação de sanções à Uber devido à concorrência desleal resultante da atividade dos motoristas que prestam serviços de transporte nessa plataforma? Como já foi explicado, (31) a Uber não é, a meu ver, um mero intermediário entre passageiros e motoristas. Organiza e gere um sistema global de transportes urbanos a pedido. Por conseguinte, é responsável não só pela oferta de ligação entre passageiros e condutores, mas também pela atividade desses condutores. O mesmo aconteceria mesmo que a prestação de ligação fosse considerada independente da prestação de transporte em sentido estrito, uma vez que estas duas prestações seriam, em última análise, efectuadas pela Uber ou em seu nome.
- A interpretação segundo a qual, para garantir a eficácia da Diretiva 2000/31, a atividade da Uber, no seu conjunto, deve beneficiar da liberalização prevista nesta diretiva deve, a meu ver, ser rejeitada. Com efeito, tal interpretação seria contrária às disposições expressas da Diretiva 2000/31, nos termos das quais só as exigências relativas aos serviços prestados por via eletrónica são abrangidas pela proibição prevista no artigo 3.°, n.° 2, da referida diretiva. (32) De acordo com esta interpretação, qualquer atividade económica poderia teoricamente ser abrangida pelo âmbito de aplicação da Diretiva 2000/31, uma vez que todos os comerciantes estão atualmente em condições de oferecer serviços por via eletrónica, como informações sobre bens ou serviços, reservas, marcações ou pagamentos.
- A Diretiva 2000/31 não se opõe, portanto, a que sejam estabelecidas no direito nacional exigências relativas à atividade de transporte em sentido estrito ou a que sejam aplicadas sanções à Uber por incumprimento dessas exigências, incluindo através de uma injunção de cessação do serviço. A atividade da Uber, pelo menos no que respeita ao serviço UberPop, em causa no processo principal, está organizada de tal forma que a Uber não pode, no estado atual, cumprir as exigências. Com efeito, a Uber recorre a motoristas não profissionais que, por não disporem de uma licença de transporte urbano, não satisfazem, por definição, as exigências em causa. O tratamento da atividade de ligação como um serviço da sociedade da informação não alteraria esta conclusão, uma vez que os serviços dos motoristas não são abrangidos pelo âmbito de aplicação da Diretiva 2000/31. Isto demonstra a artificialidade da distinção entre um serviço prestado por via eletrónica e outro que não o é, quando as duas prestações estão tão estreitamente ligadas entre si e são prestadas pela mesma pessoa.
- No entanto, não me parece que a necessidade de garantir a eficácia das regras relativas à prestação de serviços de transporte stricto sensu possa justificar o estabelecimento, como medida preventiva, da exigência de autorização para os serviços de intermediação em geral. As actividades ilícitas neste domínio só podem ser combatidas através de um sistema de execução.
- Em conclusão, considero que, se o serviço de ligação entre potenciais passageiros e condutores fosse considerado independente da prestação de serviços de transporte em sentido estrito e, por conseguinte, um serviço da sociedade da informação, o artigo 3.º, n.º 2, da Diretiva 2000/31 opor-se-ia à exigência de uma autorização para a prestação desse serviço, a menos que essa exigência se justificasse por uma das razões enumeradas no artigo 3.º, n.º 4, e fosse proporcional ao objetivo prosseguido, o que me parece pouco provável. No entanto, tal não teria qualquer efeito jurídico real, uma vez que o serviço de ligação não tem significado económico sem as prestações de transporte que, em contrapartida, o legislador nacional pode sujeitar a numerosas exigências. Aplicabilidade da Diretiva 2006/123
- No que respeita à aplicabilidade da Diretiva 2006/123, não considero necessário examinar a questão de saber se um serviço que liga, através de uma aplicação para smartphone, potenciais passageiros a motoristas que oferecem transporte urbano a pedido está abrangido pelo conceito de serviço no domínio dos transportes, na aceção do artigo 2.o , n.o 2, alínea d), desta diretiva.
- O artigo 3.°, n.° 1, da Diretiva 2006/123 prevê que é dada prevalência às disposições de outros actos do direito da União que regem o acesso a uma atividade de serviços e o seu exercício em sectores específicos, se essas disposições forem contrárias à diretiva. Embora a Diretiva 2000/31 não faça parte dos actos enumerados nesta disposição, a expressão "estes [actos] incluem" sugere claramente, a meu ver, que a lista não é exaustiva e se limita a actos cuja inclusão não é evidente em si mesma. A Diretiva 2000/31 é uma lex specialis relativamente à Diretiva 2006/123, na medida em que, mesmo na falta do artigo 3.°, n.° 1, da Diretiva 2006/123, teria de lhe ser dada prevalência, em conformidade com o adágio lex posterior generali non derogat legi priori speciali.
- Por conseguinte, se a atividade de ligação fosse considerada abrangida pela Diretiva 2000/31, não seria abrangida pelo âmbito de aplicação da Diretiva 2006/123. Conclusão
- Tendo em conta todas as considerações que precedem, proponho que o Tribunal de Justiça responda às questões prejudiciais colocadas pelo Juzgado Mercantil n.o 3 de Barcelona (Tribunal de Comércio n.o 3 de Barcelona, Espanha) do seguinte modo
(1) O artigo 2.º, alínea a), da Diretiva 2000/31/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 8 de junho de 2000, relativa a certos aspectos legais dos serviços da sociedade de informação, em especial do comércio eletrónico, no mercado interno ("diretiva sobre o comércio eletrónico"), lido em conjugação com o artigo 1.º, n.º 2, da Diretiva 98/34/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de junho de 1998, relativa a um procedimento de informação no domínio das normas e regulamentações técnicas e das regras relativas aos serviços da sociedade de informação, conforme alterada pela Diretiva 98/48/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de julho de 1998, deve ser interpretado no sentido de que um serviço que liga, através de um software de telefonia móvel, potenciais passageiros a motoristas que oferecem um transporte urbano individual a pedido, quando o prestador do serviço exerce um controlo sobre as condições essenciais que regem a oferta de transporte efectuada nesse âmbito, nomeadamente o preço, não constitui um serviço da sociedade da informação na aceção das referidas disposições.
(2) O artigo 58.º, n.º 1, do TFUE e o artigo 2.º, n.º 2, alínea d), da Diretiva 2006/123/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa aos serviços no mercado interno, devem ser interpretados no sentido de que o serviço descrito no ponto anterior constitui um serviço de transporte na aceção das referidas disposições.
1 Língua original: Francês.
2 Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de junho de 1998, relativa a um procedimento de informação no domínio das normas e regulamentações técnicas e das regras relativas aos serviços da sociedade da informação (JO L 204, p. 37), com a redação que lhe foi dada pela Diretiva 98/48/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de julho de 1998 (JO L 217, p. 18) ("Diretiva 98/34"). Embora a Diretiva 98/34 tenha sido revogada em 7 de outubro de 2015, em conformidade com o artigo 11.° da Diretiva (UE) 2015/1535 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de setembro de 2015, relativa a um procedimento de informação no domínio das regulamentações técnicas e das regras relativas aos serviços da sociedade da informação (JO L 241, p. 1), aplica-se ratione temporis aos factos do processo principal. Com efeito, a redação do artigo 1.°, n.° 1, alínea b), da Diretiva 2015/1535 é essencialmente a mesma.
3 Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 8 de junho de 2000, relativa a certos aspectos legais dos serviços da sociedade de informação, em especial do comércio eletrónico, no mercado interno ("Diretiva sobre o comércio eletrónico") (JO L 178, p. 1).
4 Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa aos serviços no mercado interno (JO L 376, p. 36).
5 Embora utilize o termo "plataforma" no presente parecer para descrever o sistema de ligação entre condutores e passageiros e de reserva de serviços de transporte, não se deve tirar daí qualquer conclusão quanto à natureza da plataforma. Em particular, este termo não significa que esteja envolvido um mero intermediário, uma vez que a Uber não é um intermediário, como explicarei mais adiante.
6 Ver, para além das informações fornecidas pela demandada no processo principal, Noto La Diega, G., "Uber law and awareness by design. An empirical study on online platforms and dehumanised negotiations", European Journal of Consumer Law, n.º 2015/2, pp. 383 a 413, nomeadamente p. 407.
7 Ver artigo 90.º do TFUE, lido em conjugação com o artigo 58.
8 Segundo travessão do segundo parágrafo do n.º 2 do artigo 1.º da Diretiva 98/34. Ênfase acrescentada.
9 Alínea h) do artigo 2º e nº 2 do artigo 3º da Diretiva 2000/31.
10 Ver, neste sentido, o acórdão de 2 de dezembro de 2010, Ker-Optika (C-108/09, EU:C:2010:725, n.os 29 e 30).
11 Acórdão de 2 de dezembro de 2010 (C-108/09, EU:C:2010:725, n.ºs 22 e 28).
12 O modo de funcionamento da Uber é já objeto de extensos escritos académicos. Ver, em particular, Noto La Diega, G., op. cit.; Rogers, B., 'The Social Cost of Uber', The University of Chicago Law Review Dialogue, 82/2015, pp. 85 a 102; Gamet, L., 'UberPop (†)', Droit social, 2015, p. 929; e Prassl, J., e Risak, M., 'Uber, Taskrabbit, and Co: Platforms as Employers? Rethinking the Legal Analysis of Crowdwork", Comparative Labor Law & Policy Journal, vol. 37 (2016), pp. 619 a 651. As questões factuais relacionadas com o método de funcionamento da Uber são também evidentes nas decisões dos tribunais nacionais dos Estados-Membros, como, por exemplo, o acórdão do London Employment Tribunal, de 28 de outubro de 2016, Aslam, Farrar e outros -v-Uber (Processo 2202551/2015); a decisão da Audiencia Provincial de Madrid n.º 15/2017, de 23 de janeiro de 2017, numa ação entre a Uber e a Asociación Madrileña del Taxi; e o despacho do Tribunale Ordinario di Milano, de 2 de julho de 2015 (processos 35445/2015 e 36491/2015).
13 Sobre a noção de economia colaborativa, ver, em particular, Hatzopoulos, V., e Roma, S., "Caring for Sharing? The Collaborative Economy under EU Law", Common Market Law Review, n.º 54, 2017, pp. 81 a 128, p. 84 e seguintes. A Comissão propôs uma definição desta noção na sua comunicação intitulada "Uma agenda europeia para a economia colaborativa" (COM(2016) 356 final, p. 3). No entanto, sendo tão ampla, é duvidoso que a definição possa ser utilizada para identificar um tipo de atividade suficientemente diferenciado que justifique um tratamento jurídico específico.
14 A partilha de boleias consiste em partilhar uma viagem comum, determinada pelo condutor e não pelo passageiro, em troca, no máximo, para o condutor, do reembolso de uma parte dos custos da viagem. O contacto entre os condutores e os potenciais passageiros é facilitado por aplicações em linha. Trata-se, portanto, de uma espécie de "boleia 2.0". Em todo o caso, não se trata de uma atividade lucrativa.
15 A Uber nega disponibilizar veículos aos condutores mas, através do seu serviço Ubermarketplace, actua como intermediário entre os condutores e as empresas de aluguer e leasing de automóveis.
16 No entanto, não é claro se isto se refere aos requisitos aplicáveis aos veículos destinados a serem utilizados no transporte remunerado de passageiros ou simplesmente às formalidades aplicáveis aos veículos para uso privado.
17 Ver acórdão do London Employment Tribunal citado na nota 12, n.º 18.
18 O elevado número de condutores permite obter o resultado pretendido sem ter de exercer um controlo direto e individual sobre cada um deles. Por outro lado, o elevado número de passageiros assegura um controlo efetivo e relativamente objetivo do comportamento dos motoristas, libertando a plataforma dessa tarefa.
19 Não estou a abordar aqui a classificação da relação jurídica entre a Uber e os seus condutores, que é uma questão de direito nacional.
20 Ver, nomeadamente, o acórdão do London Employment Tribunal citado na nota 12.
21 Ou uma plataforma semelhante, já que o modelo subjacente à Uber tem sido, desde a sua criação, replicado, embora sem atingir a mesma proeminência.
22 O facto de algumas plataformas celebrarem acordos de paridade de tarifas com hotéis, nos termos dos quais os hotéis se comprometem a não oferecer noutros locais tarifas inferiores às oferecidas na plataforma em questão, é irrelevante. Estes acordos não implicam a fixação de preços dos serviços pela plataforma, mas um compromisso relativo ao tratamento tarifário dos diferentes parceiros comerciais. No entanto, as autoridades da concorrência de vários Estados-Membros puseram em causa as cláusulas de paridade tarifária, o que levou à criação do grupo de trabalho europeu sobre as plataformas de reserva em linha, sob a égide da Comissão.
23 Por exemplo, a utilização pelos concorrentes do mesmo algoritmo para calcular o preço não é, em si, ilegal, mas pode dar origem a preocupações de conspiração hub-and-spoke quando o poder da plataforma aumenta. Relativamente a possíveis problemas associados ao modelo Uber do ponto de vista do direito da concorrência, ver Hatzopoulos, V., e Roma, S., op. cit., pp. 110 e 120, bem como Ezrachi, A., e Stucke, M.E., 'Artificial Intelligence & Collusion: When Computers Inhibit Competition", CCLP Working Paper 40, Oxford 2015, p. 14. Ver também os acórdãos de 22 de outubro de 2015, AC-Treuhand/Comissão (C-194/14 P, EU:C:2015:717), e de 21 de janeiro de 2016, Eturas e outros (C-74/14, EU:C:2016:42, n.os 27 e 28 e a jurisprudência citada), bem como as minhas conclusões nesse processo (C-74/14, EU:C:2015:493).
24 Recordo que, de acordo com as informações disponíveis, o serviço UberPop foi proibido nos Países Baixos, Estado-Membro de estabelecimento da empresa Uber BV, por acórdão do College van Beroep voor het bedrijfsleven de 8 de dezembro de 2014 (AWB 14/726, ECLI:NL:CBB:2014:450). Ver Hatzopoulos, V., e Roma, S., op. cit., p. 91.
25 Ver nºs 1 e 2 do artigo 3º da Diretiva 2000/31.
26 Incluindo o software Greyball, que permite evitar os controlos das autoridades. Ver "Uber Uses Tech to Deceive Authorities Worldwide", The New York Times de 4 de março de 2017.
27 Acórdão de 15 de outubro de 2015 (C-168/14, EU:C:2015:685).
28 Ver, nomeadamente, as decisões nacionais citadas na nota 12 do presente parecer.
29 Ver as minhas observações sobre esta questão no ponto 9 do presente parecer.
30 Recordo que o processo principal não diz respeito ao funcionamento efetivo da aplicação Uber, mas sim à prestação do serviço UberPop na cidade de Barcelona.
31 Ver, nomeadamente, os pontos 43 a 53 do presente parecer.
32 Ver artigo 3.º, n.º 2, da Diretiva 2000/31, em conjugação com o artigo 2.º, alínea h), subalínea ii), terceiro travessão. Esta disposição é confirmada pelo considerando 18 da diretiva.
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)
20 de dezembro de 2017 (*)
(Pedido de decisão prejudicial - Artigo 56.o TFUE - Artigo 58.o, n.o 1, TFUE - Serviços no domínio dos transportes - Diretiva 2006/123/CE - Serviços no mercado interno - Diretiva 2000/31/CE - Diretiva 98/34/CE - Serviços da sociedade da informação - Serviço de intermediação para ligar, através de uma aplicação para smartphone e mediante remuneração, condutores não profissionais que utilizam o seu próprio veículo a pessoas que pretendem efetuar deslocações urbanas - Exigência de autorização)
No processo C-434/15,
Pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.° TFUE, pelo Juzgado de lo Mercantil n.° 3 de Barcelona (Tribunal de Comércio n.° 3 de Barcelona, Espanha), por decisão de 16 de julho de 2015, entrado no Tribunal de Justiça em 7 de agosto de 2015, no processo
Associação Profissional Élite Taxi
v
Uber Systems Espanha SL,
O TRIBUNAL (Grande Secção),
composto por K. Lenaerts, presidente, A. Tizzano, vice-presidente, R. Silva de Lapuerta, M. Ilešič, J. L. da Cruz Vilaça, J. Malenovský e E. Levits, presidentes de secção, E. Juhász, A. Borg Barthet, D. Šváby (relator), C. Lycourgos, M. Vilaras e E. Regan, juízes,
Advogado-geral: M. Szpunar,
Secretário: M. Ferreira, Administrador Principal,
Tendo em conta o procedimento escrito e na sequência da audição de 29 de novembro de 2016,
após ter considerado as observações apresentadas em nome de:
- Asociación Profesional Elite Taxi, por M. Balagué Farré e D. Salmerón Porras, advogados, e J. A. López-Jurado González, procurador,
- Uber Systems Spain SL, por B. Le Bret e D. Calciu, advogados, R. Allendesalazar Corcho, J. J. Montero Pascual, C. Fernández Vicién e I. Moreno-Tapia Rivas, abogados,
- o Governo espanhol, por M.A. Sampol Pucurull e A. Rubio González, na qualidade de agentes,
- o Governo da Estónia, por N. Grünberg, na qualidade de agente,
- Irlanda, por E. Creedon, L. Williams e A. Joyce, na qualidade de agentes, e A. Carroll, barrister,
- o Governo grego, por M. Michelogiannaki, na qualidade de agente,
- o Governo francês, por D. Colas, G. de Bergues e R. Coesme, na qualidade de agentes,
- o Governo neerlandês, por H. Stergiou e M. Bulterman, na qualidade de agentes,
- o Governo polaco, por B. Majczyna, na qualidade de agente,
- o Governo finlandês, por S. Hartikainen, na qualidade de agente,
- a Comissão Europeia, por É. Gippini Fournier, F. Wilman, J. Hottiaux e H. Tserepa-Lacombe, na qualidade de agentes,
- o Órgão de Fiscalização da EFTA, por C. Zatschler, Ø. Bø e C. Perrin, na qualidade de agentes,
após ter ouvido as conclusões do advogado-geral na sessão de 11 de maio de 2017,
dá o seguinte
Julgamento
1 O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação dos artigos 56.° TFUE, 1.° da Diretiva 98/34/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de junho de 1998, relativa a um procedimento de informação no domínio das normas e regulamentações técnicas e das regras relativas aos serviços da sociedade da informação (JO L 204, p. 37), conforme alterada pela Diretiva 98/48/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de julho de 1998 (JO L 217, p. 18) (a seguir "Diretiva 98/34"), 3. 18) ("Diretiva 98/34"), pelo artigo 3.o da Diretiva 2000/31/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 8 de junho de 2000, relativa a certos aspectos legais dos serviços da sociedade de informação, em especial do comércio eletrónico, no mercado interno ("Diretiva sobre o comércio eletrónico") (JO L 178, p. 1), e pelos artigos 2.oe 9.o da Diretiva 2006/123/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa aos serviços no mercado interno (JO L 376, p. 36).
2 Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Asociación Profesional Elite Taxi (a seguir "Elite Taxi"), associação profissional de taxistas de Barcelona (Espanha), à Uber Systems Spain SL, sociedade coligada com a Uber Technologies Inc., a propósito da prestação por esta última, através de uma aplicação para smartphone, do serviço remunerado que consiste em ligar condutores não profissionais que utilizam o seu próprio veículo a pessoas que pretendem efetuar deslocações urbanas, sem disporem de qualquer licença ou autorização administrativa.
Contexto jurídico
legislação da UE
Diretiva 98/34/CE
3 O n.º 2 do artigo 1.º da Diretiva 98/34/CE prevê:
Para efeitos da presente diretiva, entende-se por
...
(2) "serviço", qualquer serviço da sociedade da informação, ou seja, qualquer serviço prestado normalmente mediante remuneração, à distância, por via eletrónica e mediante pedido individual de um destinatário de serviços.
Para efeitos da presente definição:
- "à distância" significa que o serviço é prestado sem que as partes estejam simultaneamente presentes,
- "por via eletrónica": significa que o serviço é enviado inicialmente e recebido no seu destino por meio de equipamento eletrónico de processamento (incluindo a compressão digital) e de armazenamento de dados, sendo inteiramente transmitido, encaminhado e recebido por cabo, rádio, meios ópticos ou outros meios electromagnéticos,
- "a pedido individual de um destinatário de serviços" significa que o serviço é prestado através da transmissão de dados a pedido individual.
O Anexo V contém uma lista indicativa dos serviços não abrangidos por esta definição.
...'
4 Em conformidade com os artigos 10.º e 11.º da Diretiva (UE) 2015/1535 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de setembro de 2015, relativa a um procedimento de informação no domínio das regulamentações técnicas e das regras relativas aos serviços da sociedade da informação (JO L 241, p. 1), a Diretiva 98/34 foi revogada em 7 de outubro de 2015. No entanto, a Diretiva 98/34 continua a ser aplicável ratione temporis ao litígio no processo principal.
Diretiva 2000/31/CE
5 O artigo 2.°, alínea a), da Diretiva 2000/31 prevê que, para efeitos desta diretiva, se entende por "serviços da sociedade da informação" os serviços na aceção do n.° 2 do artigo 1.
6 Os n.ºs 2 e 4 do artigo 3.º da Diretiva 2000/31/CE estabelecem:
'2. Os Estados-Membros não podem, por razões que se inscrevam no domínio coordenado, restringir a liberdade de prestação de serviços da sociedade da informação a partir de outro Estado-Membro.
...
- Os Estados-Membros podem adotar medidas derrogatórias do n.º 2 em relação a um determinado serviço da sociedade da informação se estiverem preenchidas as seguintes condições
(a) As medidas devem ser:
(i) necessário por uma das seguintes razões:
- a ordem pública, nomeadamente a prevenção, a investigação, a deteção e a repressão de infracções penais, incluindo a proteção de menores e a luta contra qualquer incitamento ao ódio em razão da raça, do sexo, da religião ou da nacionalidade, bem como contra as violações da dignidade humana relativas a pessoas individuais,
- a proteção da saúde pública,
- segurança pública, incluindo a salvaguarda da segurança e da defesa nacionais,
- a proteção dos consumidores, incluindo os investidores;
(ii) tomadas contra um determinado serviço da sociedade da informação que prejudique os objectivos referidos na subalínea i) ou que apresente um risco sério e grave de prejudicar esses objectivos;
(iii) proporcionais a esses objectivos;
(b) Antes de tomar as medidas em questão e sem prejuízo dos processos judiciais, incluindo os processos preliminares e os actos praticados no âmbito de uma investigação criminal, o Estado-Membro tenha
- solicitou ao Estado-Membro referido no n.º 1 que tomasse medidas e este não as tomou ou tomou-as de forma inadequada,
- notificou a Comissão e o Estado-Membro referido no n.o 1 da sua intenção de adotar tais medidas.
Diretiva 2006/123/CE
7 De acordo com o considerando 21 da Diretiva 2006/123, "os serviços de transporte, incluindo os transportes urbanos, os táxis e as ambulâncias, bem como os serviços portuários, devem ser excluídos do âmbito de aplicação da presente diretiva".
8 O artigo 2.º, n.º 2, alínea d), da Diretiva 2006/123 prevê que a diretiva não se aplica aos serviços no domínio dos transportes, incluindo os serviços portuários, abrangidos pelo âmbito de aplicação do Título V da Parte III do Tratado CE, que passou a ser o Título VI da Parte III do Tratado FUE.
9 Nos termos do n.º 1 do artigo 9.º da Diretiva 2006/123, que se insere no seu capítulo III, intitulado "Liberdade de estabelecimento dos prestadores":
Os Estados-Membros só submeterão o acesso a uma atividade de serviços ou o seu exercício a um regime de autorização se estiverem preenchidas as seguintes condições
(a) o regime de autorização não é discriminatório para o prestador em causa;
(b) A necessidade de um regime de autorização é justificada por uma razão imperiosa de interesse geral;
(c) O objetivo prosseguido não pode ser alcançado através de uma medida menos restritiva, nomeadamente porque um controlo a posteriori seria efectuado demasiado tarde para ser verdadeiramente eficaz".
10 No capítulo IV da diretiva, intitulado "Livre circulação de serviços", o artigo 16.º estabelece os procedimentos que permitem aos prestadores de serviços prestar serviços num Estado-Membro diferente daquele em que estão estabelecidos.
Direito espanhol
11 Na área metropolitana de Barcelona, os serviços de táxi são regulados pela Ley 19/2003 del Taxi, de 4 de julho de 2003 (DOGC n.º 3926 de 16 de julho de 2003 e BOE n.º 189 de 8 de agosto de 2003) e pelo Reglamento Metropolitano del Taxi, de 22 de julho de 2004, adotado pelo Consell Metropolitá da Entitat Metropolitana de Transport de Barcelona.
12 Nos termos do artigo 4º da referida lei:
'1. A prestação de serviços de táxi urbano está sujeita à concessão prévia de uma licença que habilite o titular da licença para cada veículo destinado ao exercício dessa atividade.
- As licenças para a prestação de serviços de táxi urbano são emitidas pelas câmaras municipais ou pelas autoridades locais competentes no território onde a atividade é exercida.
- A prestação de serviços de táxi interurbano está sujeita à concessão prévia da correspondente autorização emitida pelo Ministério dos Transportes do Governo Regional". O litígio no processo principal e as questões prejudiciais
13 Em 29 de outubro de 2014, a Elite Taxi intentou uma ação no Juzgado de lo Mercantil n.° 3 de Barcelona (Tribunal de Comércio n.° 3 de Barcelona, Espanha), pedindo que este órgão jurisdicional declare que as atividades da Uber Systems Spain violam a legislação em vigor e constituem práticas enganosas e atos de concorrência desleal, na aceção da Ley 3/1991 de Competencia Desleal (Lei n.° 3/1991 de concorrência desleal), de 10 de janeiro de 1991. A Elite Taxi alega ainda que a Uber Systems Spain deve ser condenada a cessar o seu comportamento desleal que consiste em apoiar outras empresas do grupo através da prestação de serviços de reserva a pedido por meio de dispositivos móveis e da Internet. Por último, pede que o tribunal proíba a Uber Systems Spain de exercer tal atividade no futuro.
14 O Juzgado de lo Mercantil n.° 3 de Barcelona (Tribunal de Comércio n.° 3 de Barcelona) observou, a título preliminar, que, embora a Uber Systems Spain exerça a sua atividade em Espanha, esta atividade está ligada a uma plataforma internacional, o que justifica a apreciação a nível da União da atuação desta sociedade. Observou igualmente que nem a Uber Systems Spain nem os condutores não profissionais dos veículos em causa dispõem das licenças e autorizações exigidas pelo regulamento relativo aos serviços de táxi na área metropolitana de Barcelona, de 22 de julho de 2004.
15 Para determinar se as práticas da Uber Systems Spain e das sociedades coligadas (em conjunto, "Uber") podem ser qualificadas como práticas desleais que violam as regras espanholas da concorrência, o Juzgado de lo Mercantil n.° 3 de Barcelona (Tribunal de Comércio n.° 3 de Barcelona) considera necessário verificar se a Uber necessita ou não de uma autorização administrativa prévia. Para o efeito, o tribunal considera que é necessário determinar se os serviços prestados por esta sociedade devem ser considerados serviços de transporte, serviços da sociedade da informação ou uma combinação de ambos. Segundo o órgão jurisdicional, a exigência ou não de uma autorização administrativa prévia depende da qualificação adoptada. Em particular, o órgão jurisdicional de reenvio considera que, se o serviço em causa fosse abrangido pela Diretiva 2006/123 ou pela Diretiva 98/34, as práticas da Uber não poderiam ser consideradas práticas desleais.
16 Para este efeito, o órgão jurisdicional de reenvio indica que a Uber contacta ou se liga a motoristas não profissionais aos quais fornece um certo número de ferramentas informáticas - uma interface - que lhes permite, por sua vez, ligarem-se a pessoas que pretendem efetuar deslocações urbanas e que acedem ao serviço através da aplicação informática com o mesmo nome. Segundo o tribunal, a atividade da Uber tem fins lucrativos.
17 O órgão jurisdicional de reenvio indica igualmente que o pedido de decisão prejudicial não diz respeito, de modo algum, a estes elementos de facto, mas apenas à qualificação jurídica do serviço em causa.
18 Consequentemente, o Juzgado de lo Mercantil n.º 3 de Barcelona (Tribunal de Comércio n.º 3 de Barcelona) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais
"1) Na medida em que o artigo 2.o , n.o 2, alínea d), da Diretiva 2006/123/CE exclui as actividades de transporte do âmbito de aplicação desta diretiva, a atividade exercida com fins lucrativos pela Uber Systems Spain, que consiste em servir de intermediário entre o proprietário de um veículo e uma pessoa que necessita de efetuar um trajeto no interior de uma cidade, gerindo os meios informáticos - nas palavras da Uber Systems Spain? interface "smartphone e plataforma tecnológica" e aplicação informática - que lhes permitem conectar-se entre si, pode ser considerado um mero serviço de transporte ou deve ser considerado um serviço de intermediação eletrónica ou um serviço da sociedade da informação, como definido no artigo 1.o , n.o 2, da Diretiva 98/34?
(2) No âmbito da identificação da natureza jurídica dessa atividade, pode considerar-se que se trata ... em parte, de um serviço da sociedade da informação e, em caso afirmativo, deve o serviço de intermediação eletrónica beneficiar do princípio da livre prestação de serviços garantido pela legislação [comunitária] - artigo 56.o TFUE e Diretivas [2006/123] e ... [2000/31]?
(3) Se o serviço prestado pela [Uber Systems Spain] não fosse considerado um serviço de transporte e, portanto, fosse considerado abrangido pelos casos previstos na Diretiva 2006/123, o artigo 15.o da Lei [n.o 3/1991] relativa à concorrência desleal [de 10 de janeiro de 1991] - relativo à violação das normas que regulam a atividade concorrencial - é contrário à Diretiva 2006/123? concretamente o artigo 9.o , relativo à liberdade de estabelecimento e aos regimes de autorização, quando a remissão para a legislação nacional ou para as disposições legais é feita sem ter em conta que o regime de obtenção de licenças, autorizações e permissões não pode ser de modo algum restritivo ou desproporcionado, ou seja, não pode entravar injustificadamente o princípio da liberdade de estabelecimento?
(4) Caso se confirme que a Diretiva [2000/31] é aplicável ao serviço prestado pela [Uber Systems Spain], as restrições num Estado-Membro à liberdade de prestar o serviço de intermediação eletrónica a partir de outro Estado-Membro, sob a forma de subordinação do serviço a uma autorização ou a uma licença, ou sob a forma de uma injunção que proíba a prestação do serviço de intermediação eletrónica com base na aplicação da legislação nacional em matéria de concorrência desleal, são medidas válidas que constituem derrogações ao artigo 3.o , n.o 2, da Diretiva [2000/31], nos termos do seu artigo 3.o , n.o 4?
A competência do Tribunal
19 A Elite Taxi alega que a qualificação jurídica do serviço prestado pela Uber não é da competência do Tribunal de Justiça, uma vez que essa qualificação exige uma decisão sobre questões de facto. Nestas condições, segundo a Elite Taxi, o Tribunal de Justiça não é competente para responder às questões prejudiciais.
20 A este respeito, importa recordar que o órgão jurisdicional de reenvio indicou claramente, como resulta do n.° 17 do presente acórdão, que as suas questões se referem unicamente à qualificação jurídica do serviço em causa e não a uma constatação ou a uma apreciação dos factos do litígio no processo principal. A qualificação em direito da União dos factos apurados por esse órgão jurisdicional implica, no entanto, uma interpretação do direito da União para a qual, no âmbito do processo previsto no artigo 267.° TFUE, o Tribunal de Justiça é competente (v., neste sentido, acórdão de 3 de dezembro de 2015, Banif Plus Bank, C-312/14, EU:C:2015:794, n.os 51 e 52).
21 O Tribunal de Justiça é, por conseguinte, competente para responder às questões colocadas.
Apreciação das questões submetidas
Admissibilidade
22 Os Governos espanhol, grego, neerlandês, polaco e finlandês, a Comissão Europeia e o Órgão de Fiscalização da EFTA observam que a decisão de reenvio não é suficientemente precisa no que diz respeito tanto à legislação nacional aplicável como à natureza das actividades em causa no processo principal.
23 A este respeito, há que recordar que o Tribunal de Justiça só pode recusar pronunciar-se sobre uma questão submetida por um órgão jurisdicional nacional quando for manifesto que a interpretação do direito da União solicitada não tem qualquer relação com a realidade ou com o objeto do litígio no processo principal, quando o problema for hipotético ou quando o Tribunal de Justiça não dispuser dos elementos de facto e de direito necessários para lhe permitir dar uma resposta útil às questões que lhe são submetidas (acórdão de 27 de junho de 2017, Congregación de Escuelas Pías Provincia Betania, C-74/16, EU:C:2017:496, n.° 25).
24 Relativamente a este último ponto, a necessidade de fornecer uma interpretação do direito da União útil ao órgão jurisdicional de reenvio exige que este, em conformidade com o artigo 94.°, alíneas a) e b), do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, defina o quadro factual e legislativo das questões que coloca ou, pelo menos, explique as circunstâncias de facto em que essas questões se baseiam (v. acórdão de 10 de maio de 2017, de Lobkowicz, C-690/15, EU:C:2017:355, n.° 28).
25 Além disso, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, as informações fornecidas nas decisões de reenvio não só permitem ao Tribunal de Justiça dar respostas úteis, como também servem para garantir que os governos dos Estados-Membros e os outros interessados tenham a possibilidade de apresentar observações, em conformidade com o artigo 23. Compete ao Tribunal de Justiça garantir que essa possibilidade seja salvaguardada, uma vez que, nos termos do artigo 23.°, apenas as decisões de reenvio são notificadas aos interessados, acompanhadas de uma tradução na língua oficial de cada Estado-Membro, mas com exclusão de qualquer processo que possa ser enviado ao Tribunal de Justiça pelo órgão jurisdicional nacional (acórdão de 4 de maio de 2016, Pillbox 38, C-477/14, EU:C:2016:324, n.° 26 e jurisprudência referida).
26 No caso em apreço, há que salientar que a decisão de reenvio, embora sucinta na sua referência às disposições nacionais pertinentes, serve, no entanto, para identificar as que podem ser aplicáveis à prestação do serviço em causa no processo principal, do que decorre a necessidade de uma licença ou de uma autorização administrativa prévia para esse efeito.
27 Do mesmo modo, a descrição que o órgão jurisdicional de reenvio faz do serviço prestado pela Uber, cujo teor consta do n.° 16 do presente acórdão, é suficientemente precisa.
28 Por último, em conformidade com o artigo 94.°, alínea c), do Regulamento de Processo, o órgão jurisdicional de reenvio expõe de forma precisa os motivos da sua incerteza quanto à interpretação do direito da União.
29 Por conseguinte, há que considerar que a decisão de reenvio contém os elementos de facto e de direito necessários para que o Tribunal de Justiça possa dar uma resposta útil ao órgão jurisdicional de reenvio e para que os interessados possam tomar utilmente posição sobre as questões submetidas ao Tribunal de Justiça, em conformidade com a jurisprudência referida no n.° 25 do presente acórdão.
30 O Governo polaco exprime igualmente as suas dúvidas quanto à aplicabilidade do artigo 56.° TFUE ao caso em apreço, nomeadamente pelo facto de a matéria em causa no processo principal ser alegadamente uma questão puramente interna.
31 Ora, resulta da decisão de reenvio, nomeadamente das informações referidas no n.° 14 do presente acórdão e dos outros documentos juntos aos autos, que o serviço em causa no processo principal é prestado através de uma sociedade que opera a partir de outro Estado-Membro, a saber, o Reino dos Países Baixos.
32 Nestas condições, o pedido de decisão prejudicial deve ser considerado admissível.
Substância
33 Com a sua primeira e segunda questões, que devem ser analisadas conjuntamente, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 56.° TFUE, lido em conjugação com o artigo 58.°, n.° 1, TFUE, bem como com os artigos 2.°, n.° 2, alínea d), da Diretiva 2006/123 e 1.°, n.° 2, da Diretiva 98/34, para os quais remete o artigo 2.°, alínea a), da Diretiva 2000/31, devem ser interpretados no sentido de que um serviço de intermediação como o que está em causa no processo principal, que tem por objetivo ligar, através de uma aplicação para smartphone e mediante remuneração, condutores não profissionais que utilizam o seu próprio veículo a pessoas que pretendem efetuar deslocações urbanas, deve ser qualificado de "serviço no domínio dos transportes", na aceção do artigo 58, através de uma aplicação para smartphone e mediante remuneração, condutores não profissionais que utilizam o seu próprio veículo a pessoas que pretendem efetuar deslocações urbanas, deve ser qualificado de "serviço no domínio dos transportes" na aceção do artigo 58.o, n.o 1, TFUE e, por conseguinte, excluído do âmbito de aplicação do artigo 56.o TFUE, da Diretiva 2006/123 e da Diretiva 2000/31, ou se, pelo contrário, o serviço está abrangido pelo artigo 56.o TFUE, pela Diretiva 2006/123 e pela Diretiva 2000/31.
34 A este respeito, importa salientar que um serviço de intermediação que consiste em ligar um condutor não profissional que utiliza o seu próprio veículo a uma pessoa que pretende efetuar um trajeto urbano é, em princípio, um serviço distinto de um serviço de transporte que consiste no ato físico de deslocação de pessoas ou de mercadorias de um local para outro por meio de um veículo. Acrescente-se que cada um destes serviços, considerados separadamente, pode estar ligado a diferentes diretivas ou disposições do Tratado FUE em matéria de livre prestação de serviços, como prevê o órgão jurisdicional de reenvio.
35 Assim, um serviço de intermediação que permite a transferência, através de uma aplicação para smartphone, de informações relativas à reserva de um serviço de transporte entre o passageiro e o motorista não profissional que efetuará o transporte utilizando o seu próprio veículo, preenche, em princípio, os critérios de qualificação de "serviço da sociedade da informação" na aceção do artigo 1.°, n.° 2, da Diretiva 98/34 e do artigo 2. Este serviço de intermediação, de acordo com a definição constante do artigo 1.°, n.° 2, da Diretiva 98/34, é "um serviço prestado normalmente mediante remuneração, à distância, por via eletrónica e mediante pedido individual de um destinatário de serviços".
36 Em contrapartida, os serviços de transporte urbano não públicos, como os serviços de táxi, devem ser qualificados de "serviços no domínio dos transportes", na aceção do artigo 2.°, n.° 2, alínea d), da Diretiva 2006/123, lido à luz do seu considerando 21 (v., neste sentido, acórdão de 1 de outubro de 2015, Trijber e Harmsen, C-340/14 e C-341/14, EU:C:2015:641, n.° 49).
37 No entanto, há que observar que um serviço como o do processo principal é mais do que um serviço de intermediação que consiste em ligar, através de uma aplicação para smartphone, um condutor não profissional que utiliza o seu próprio veículo a uma pessoa que deseja efetuar um trajeto urbano.
38 Numa situação como a que está em causa no órgão jurisdicional de reenvio, em que os passageiros são transportados por motoristas não profissionais que utilizam o seu próprio veículo, o prestador desse serviço de intermediação oferece simultaneamente serviços de transporte urbano, que torna acessíveis, nomeadamente, através de ferramentas informáticas como a aplicação em causa no processo principal e cuja exploração geral organiza em benefício das pessoas que desejam aceitar essa oferta para efetuar um trajeto urbano.
39 A este respeito, resulta dos elementos de que dispõe o Tribunal de Justiça que o serviço de intermediação prestado pela Uber se baseia na seleção de motoristas não profissionais que utilizam o seu próprio veículo, aos quais a sociedade fornece uma aplicação sem a qual (i) esses motoristas não seriam levados a prestar serviços de transporte e (ii) as pessoas que pretendem efetuar um trajeto urbano não utilizariam os serviços prestados por esses motoristas. Além disso, a Uber exerce uma influência decisiva sobre as condições em que esse serviço é prestado por esses motoristas. Relativamente a este último ponto, verifica-se, nomeadamente, que a Uber determina pelo menos a tarifa máxima através da aplicação epónima, que a sociedade recebe esse montante do cliente antes de pagar uma parte ao condutor não profissional do veículo e que exerce um certo controlo sobre a qualidade dos veículos, dos condutores e do seu comportamento, que pode, em determinadas circunstâncias, levar à sua exclusão.
40 Este serviço de intermediação deve, assim, ser considerado como fazendo parte integrante de um serviço global cuja componente principal é um serviço de transporte e, por conseguinte, deve ser qualificado não de "serviço da sociedade da informação", na aceção do artigo 1.°, n.° 2, da Diretiva 98/34, para o qual remete o artigo 2.°, alínea a), da Diretiva 2000/31, mas de "serviço no domínio dos transportes", na aceção do artigo 2.
41 Esta qualificação é, com efeito, confirmada pela jurisprudência do Tribunal de Justiça, segundo a qual o conceito de "serviços no domínio dos transportes" inclui não só os serviços de transporte em si mesmos, mas também qualquer serviço intrinsecamente ligado a qualquer ato físico de deslocação de pessoas ou de bens de um lugar para outro através de um meio de transporte (v., neste sentido, acórdão de 15 de outubro de 2015, Grupo Itevelesa e o., C-168/14, EU:C:2015:685, n.os 45 e 46, e Parecer 2/15 (Acordo de Comércio Livre com Singapura), de 16 de maio de 2017, EU:C:2017:376, n.º 61).
42 Por conseguinte, a Diretiva 2000/31 não se aplica a um serviço de intermediação como o que está em causa no processo principal.
43 Este serviço, na medida em que é qualificado de "serviço no domínio dos transportes", também não está abrangido pela Diretiva 2006/123, uma vez que este tipo de serviço está expressamente excluído do âmbito de aplicação desta diretiva, nos termos do seu artigo 2.
44 Além disso, uma vez que o serviço de intermediação em causa no processo principal deve ser qualificado de "serviço no domínio dos transportes", não é abrangido pelo artigo 56.° TFUE, relativo à livre prestação de serviços em geral, mas pelo artigo 58.°, n.° 1, TFUE, disposição específica segundo a qual "a livre prestação de serviços no domínio dos transportes é regulada pelas disposições do título relativo aos transportes" (v., neste sentido, acórdão de 22 de dezembro de 2010, Yellow Cab Verkehrsbetrieb, C-338/09, EU:C:2010:814, n.° 29 e jurisprudência referida).
45 Assim, a aplicação do princípio da livre prestação de serviços deve ser realizada, segundo o Tratado FUE, através da execução da política comum dos transportes (acórdão de 22 de dezembro de 2010, Yellow Cab Verkehrsbetrieb, C-338/09, EU:C:2010:814, n.° 30 e jurisprudência referida).
46 No entanto, há que salientar que os serviços de transporte urbano não públicos e os serviços que estão intrinsecamente ligados a esses serviços, como o serviço de intermediação em causa no processo principal, não deram lugar à adoção pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho da União Europeia de regras comuns ou de outras medidas baseadas no artigo 91.
47 Daqui resulta que, no estado atual do direito da União, compete aos Estados-Membros regulamentar as condições em que devem ser prestados serviços de intermediação como os que estão em causa no processo principal, em conformidade com as regras gerais do Tratado FUE.
48 Por conseguinte, há que responder à primeira e à segunda questões que o artigo 56.° TFUE, conjugado com o artigo 58.°, n.° 1, TFUE, bem como com o artigo 2.°, n.° 2, alínea d), da Diretiva 2006/123 e com o artigo 1.°, n.° 2, da Diretiva 98/34, para o qual remete o artigo 2.°, alínea a), da Diretiva 2000/31, deve ser interpretado no sentido de que um serviço de intermediação como o que está em causa no processo principal cujo objetivo é ligar, através de uma aplicação para smartphone e mediante remuneração, condutores não profissionais que utilizam o seu próprio veículo a pessoas que pretendem efetuar deslocações urbanas, deve ser considerado intrinsecamente ligado a um serviço de transporte e, por conseguinte, deve ser qualificado de "serviço no domínio dos transportes", na aceção do artigo 58.o, n.o 1, TFUE. Por conseguinte, este serviço deve ser excluído do âmbito de aplicação do artigo 56.º do TFUE, da Diretiva 2006/123 e da Diretiva 2000/31.
49 Tendo em conta a resposta dada à primeira e à segunda questões, não é necessário responder à terceira e à quarta questões, que foram colocadas no pressuposto da aplicação da Diretiva 2006/123 ou da Diretiva 2000/31.
Custos
50 Uma vez que o presente processo constitui, para as partes no processo principal, uma etapa da ação pendente no órgão jurisdicional nacional, a decisão sobre as despesas compete a este último. As despesas efectuadas com a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça, para além das despesas das partes, não são reembolsáveis.
Por estes motivos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) decide:
da Diretiva 2006/123/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa aos serviços no mercado interno, e o n.º 2 do artigo 1.º da Diretiva 98/34/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de junho de 1998, relativa a um procedimento de informação no domínio das normas e regulamentações técnicas e das regras relativas aos serviços da sociedade da informação, com a redação que lhe foi dada pela Diretiva 98/48/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de julho de 1998, a que se refere a alínea a) do artigo 2º da Diretiva 2000/31/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 8 de junho de 2000, relativa a certos aspectos legais dos serviços da sociedade de informação, em especial o comércio eletrónico, no mercado interno (a seguir "diretiva sobre o comércio eletrónico"), deve ser interpretado no sentido de que um serviço de intermediação como o que está em causa no processo principal, que tem por objeto ligar, através de uma aplicação para smartphone e mediante remuneração, condutores não profissionais que utilizam o seu próprio veículo a pessoas que pretendem efetuar deslocações urbanas, deve ser considerado intrinsecamente ligado a um serviço de transporte e, por conseguinte, deve ser qualificado de "serviço no domínio dos transportes", na aceção do artigo 58.o, n.o 1, TFUE. Por conseguinte, este serviço deve ser excluído do âmbito de aplicação do artigo 56.º do TFUE, da Diretiva 2006/123 e da Diretiva 2000/31.