...

US$

km

Blogue
Plataformas digitais na UE: Explicação do estatuto jurídico da Airbnb

Plataformas digitais na UE: Explicação do estatuto jurídico da Airbnb

Leo Besutti
por 
Leo Besutti
4 minutos de leitura
Tendências
fevereiro 10, 2025

A classificação das plataformas digitais tornou-se uma questão jurídica fundamental nos anos vinte, em especial nos sectores em que os quadros regulamentares tradicionais se cruzam com a inovação tecnológica. Uma das questões mais debatidas é saber se plataformas como a Airbnb devem ser consideradas meros "serviços da sociedade da informação" nos termos da Diretiva 2015/1535 ou se devem estar sujeitas aos regulamentos nacionais que regem os serviços imobiliários e de hotelaria, ou seja, se são prestadores de serviços finais. Esta distinção influencia as obrigações impostas a essas plataformas e a medida em que as autoridades nacionais podem regular as suas actividades.

Conceção digital

Quadro regulamentar da UE

A Diretiva 2015/1535 define um "serviço da sociedade da informação" como um serviço que é:

  1. Prevê-se uma remuneração,
  2. À distância,
  3. Por meios electrónicos,
  4. A pedido individual de um destinatário.

Em geral, os Estados-Membros da UE não podem impor restrições arbitrárias a esses serviços, incluindo a exigência de autorização prévia ou licenciamento dos prestadores, exceto em casos excepcionais, na sequência de um procedimento especial que implica a notificação da Comissão Europeia.

Por outro lado, os serviços que não se enquadram nesta classificação, como o aluguer de imóveis ou os serviços de hotelaria, podem estar sujeitos a regulamentações nacionais, incluindo o licenciamento, a tributação e o cumprimento das leis locais que regem a utilização da propriedade. Estes requisitos variam de país para país na UE.

O caso Airbnb: análise jurídica (C-390/18)

Em dezembro de 2019, o Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) abordou esta questão em Airbnb Ireland UC v. AHTOP (Processo C-390/18). O processo resultou de um recurso interposto por uma associação de turismo francesa, a AHTOP, que alegou que a Airbnb devia estar sujeita à regulamentação nacional aplicável aos agentes imobiliários.

O TJUE decidiu a favor da Airbnb, concluindo que o seu principal serviço é prestar um "serviço da sociedade da informação" e não um serviço imobiliário. O Tribunal chegou a esta conclusão com base em vários factores fundamentais:

  1. A Airbnb actua como intermediário entre anfitriões e hóspedes através de uma plataforma digital.
  2. Não fixa preços de aluguer nem impõe condições específicas para os contratos de aluguer. Não intervém na composição do produto final. 
  3. Não é proprietária nem gere os imóveis listados na sua plataforma.
  4. Não presta diretamente serviços de hotelaria, tais como limpeza, manutenção ou receção.
  5. Não exige que os anfitriões obtenham autorizações ou qualificações específicas para além do cumprimento das leis locais.

Com base nestes factores, o Tribunal decidiu que o principal serviço da Airbnb é a intermediação e que é distinto do fornecimento efetivo de alojamento para arrendamento, devendo ser classificado como um serviço da sociedade da informação. Consequentemente, a Airbnb beneficia das protecções oferecidas pela Diretiva 2000/31 (Diretiva sobre o comércio eletrónico), que limita a capacidade dos Estados-Membros de imporem regulamentações restritivas sem aderirem aos procedimentos de notificação da UE.

Implicações para as plataformas digitais

O acórdão do TJUE tem implicações significativas para as plataformas digitais que operam nos sectores do alojamento e dos serviços. Ao contrário da Uber, que foi classificada como um serviço de transporte, não reconhecido como ISS devido ao seu envolvimento na formação de preços e produtos e ao seu controlo sobre os condutores e as tarifas, a Airbnb não exerce um controlo semelhante sobre os proprietários de imóveis e as condições de arrendamento, nem controla os preços. Por conseguinte, foi reconhecido como um intermediário e não como um prestador de serviços imobiliários.

No entanto, esta decisão não se aplica universalmente a todas as plataformas. A classificação depende de critérios específicos, incluindo:

  1. Se a plataforma exerce controlo sobre os prestadores de serviços (por exemplo, fixando preços, ditando condições ou gerindo operações).
  2. Se a plataforma fornece diretamente serviços essenciais para além do matchmaking (por exemplo, possuir bens, oferecer transporte ou manter propriedades de aluguer).
  3. Se os prestadores de serviços (por exemplo, anfitriões ou condutores) podem funcionar de forma independente fora da plataforma.
  4. Se o prestador de serviços está a tentar contornar a legislação aplicável (em matéria de licenciamento, registo, etc.).

O Tribunal decidiu de forma diferente noutros casos, como o da Uber, em que se considerou que a empresa desempenhava um papel essencial na organização e prestação de serviços de transporte. Do mesmo modo, no processo Aplicação Star Taxi o TJUE analisou o papel de uma aplicação de transporte e determinou que esta constitui um serviço de informação ou um prestador de serviços de transporte.

Assim, a classificação jurídica das plataformas digitais depende muito do seu modelo operacional e do nível de controlo sobre os prestadores de serviços. O caso Airbnb demonstra que as plataformas que funcionam essencialmente como intermediárias, sem fixar preços ou ditar as principais condições de serviço, podem ser classificadas como serviços da sociedade da informação ao abrigo da legislação da UE. No entanto, as plataformas que exercem um controlo significativo sobre a prestação de serviços - como a Uber - podem ser classificadas como prestadores de serviços sujeitos a regulamentações nacionais mais rigorosas.